Quando a criança era criança
Olhava a nervura das folhas
E observava a grama crescer,
Porque tinha todo o tempo do mundo.
Quando a criança era criança
Vivia sujo por fora
Sem conhecer a sujeira por dentro,
Pisava em poças d’água de chuva
E perguntava se faltava muito para chegar.
Assustava com aranhas,
Tinha medo do escuro,
Achava que tinha jacaré debaixo da cama,
E não gostava de comer abacate.
Quando a criança era criança
Não existiam cores, credos ou níveis,
Só existiam crianças e brincadeiras
E quem diria, dormia-se à noite.
Quando a criança era criança
Não sabia de guerra ou desamor,
Bomba atômica ou seqüestro.
Sabiamente ignorante que se era.
Quando a criança era criança,
Desejava ser adulto e conhecer as coisas.
Quando a criança é adulta,
Deseja ser criança de novo
E esquecer tudo que aprendeu.
Quando a criança era criança
Rezava ao pé da cama,
E pedia pelo papai, mamãe e todo mundo.
Depois não se reza mais
E só se pede para si mesmo.
Quando a criança era criança
Tudo era novidade, o vôo dos pássaros,
O mar de ressaca, uma minhoca no vaso,
À noite e o dia, sol e lua,
O tempo corria lento e tudo era grande.
Era-se feliz
Quando a criança era criança.
Danilo Otoch.